Consumo e felicidade
Patrick Terrien, chef francês e diretor da escola de culinária Le Cordon Bleu, declarou à coluna “As últimas 10 coisas que comprei”, do caderno Vitrine, da Folha, ter comprado champanhe, flores, foie gras, laranjas, cogumelos selvagens, água, jornal, pão, um CD e entradas para o cinema.
O que uma pessoa compra dá uma boa noção de como ela vive. No caso do chef, tudo o que ele comprou foi para o consumo em família, para presentear um amigo e sair com a mulher.
Comprou coisas que não duram nem podem ser exibidas, mas podem tornar a relação entre as pessoas próximas a ele mais agradável e apetitosa.
[...]
Mas, na sociedade de consumo, vivemos para sermos felizes por meio do que adquirimos. Paradoxalmente, por meio daquilo que descartamos.
A aquisição de mercadorias satisfaz nossos desejos e providencia nossa felicidade. Mas os desejos são inesgotáveis. Brotam de todo contato que temos com o que existe no mundo. Um dá lugar a outro, e satisfazê-los é tarefa impossível.
Como as mercadorias são produzidas com a finalidade primeira de serem compradas, a sociedade de consumo precisa permanentemente provocar nossa insatisfação com o que temos e atiçar nosso desejo pelo que ainda não temos. Toda propaganda de alguma mercadoria sugere, subliminarmente, que aquela que temos está ultrapassada e não pode nos oferecer o que a nova poderá. Não comprá-la é ficar em falta com nós mesmos e não pertencer ao círculo especial dos que já a adquiriram.
Enredados nesse modo-contínuo de insatisfação/ descarte/consumo, compreendemos a máxima da vida: sempre seremos felizes por pouco tempo.
Toda suposta felicidade antecipa uma infelicidade. E, enquanto saltamos de uma infelicidade a outra, a almejada felicidade passa a ser um breve intervalo, sempre imperceptível.
A felicidade, substituída pela satisfação de desejos nunca aplacáveis, jamais é experimentada. O que nos resta é a ansiedade da felicidade.
As compras do chef francês sugerem que ele se desvia dessa sedução consumista. Fruir, mais do que ter. E não apenas o sabor do foie gras ou dos cogumelos, mas o prazer de repartir com amigos e familiares pequenos prazeres. Celebração e simplicidade.
(DULCE CRITELLI, terapeuta existencial e professora de filosofia da PUC-SP,
é autora de “Educação e Dominação Cultural” e “Analítica de Sentido” e
coordenadora do Existentia – Centro de Orientação e Estudos da Condição
Humana dulcecritelli@existentia.com.br Cristiane Segatto. Disponível em:
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/equilibrio/eq1211200901.htm. Acesso
em: 01/2020. DULCE CRITELLI/FOLHAPRESS. Adaptado.)
NÃO evidencia corretamente o significado dos termos destacados de acordo com o contexto em que são apresentados:
“ [...] sempre imperceptível.” (8º§) / sutil
“[...] sugere, subliminarmente, [...]” (6º§) / de modo fugaz
“Enredados nesse modo-contínuo [...]” (7º§) / que estão envolvidos
“a almejada felicidade [...]” (8º§) / desejada com grande intensidade